Wednesday, March 07, 2007

Agradeço por ser mulher

Agrada-me que digam que sou histérica, porque então posso jogar os pratos na cabeça de quem me causa sofrimento.

Gosto que me chamem de bruxa, porque então posso mudar a direção dos ventos a meu favor.

Gosto que me chamem de demônio, porque posso queimar o leito onde me abusam.

Gosto que me chamem de puta, porque então posso fazer amor com quem me dá vontade.

Gosto que digam que sou frágil, porque me lembram que a união faz a força.

Gosto que digam que sou fofoqueira, porque nada do que é humano me será alheio.

Porém, o que mais agradeço, o que mais me agrada, o que eu mais gosto e o que me faz mais feliz é que me digam que sou louca, porque então nenhuma liberdade me será negada.

Agrada-me saber que meu cérebro é menor que o cérebro do homem, porque então meu cérebro cabe em todos os lugares.

Agrada-me que me digam que careço de lógica, porque então posso criar uma lógica menos fria e mais vital.

Agrada-me que digam que sou vaidosa, porque posso olhar-me no espelho sem me sentir culpada.

Agrada-me que me digam que sou emocional, porque posso chorar e rir à vontade.

Mil e uma vezes a Inquisição me queimou e aprendi a nascer das cinzas.

Prenderam-me em um harém e, enclausurada, não deixei de rir.

Colocaram um cinturão de castidade e adquiri a arte de um serralheiro.

Carreguei fardos de lenha e me fiz forte.

Cobriram-me o rosto com véus e aprendi a olhar sem ser vista.

Os filhos me acordaram à meia-noite e aprendi a manter-me em vigília.

Não me enviaram à Universidade e aprendi a pensar por minha conta.

Transportei cântaros de água e soube manter o equilíbrio.

Extirparam-me o clitóris e aprendi a gozar com todo o corpo.

Passei dias bordando e tecendo e minhas mãos aprenderam a ser mais exatas que as de um cirurgião.

Ceifei o trigo e colhi o milho, porém me roubaram a comida e com fome aprendi a viver.

Sacrificaram- me aos deuses e aos homens, e voltei a viver.

Espancaram-me e perdi os dentes, e voltei a viver.

Assassinaram- me e me ultrajaram, e voltei a viver.

Arrancaram de mim meus filhos e, no pranto, voltei à vida.

Agradeço por ser um animal, porque os homens colocaram em perigo a sobrevivência do planeta.

Agradeço por ser mulher porque o homem não é o centro do universo e sim apenas mais um elo perdido na cadeia da vida.

Agradeço que me digam que sou irracional, porque a razão tem conduzido aos piores atos de barbárie.

Agradeço por não ter inventado a tecnologia, porque ela tem envenenado a água e o ozônio.
Agradeço que me tenham colocado mais perto da natureza, porque nunca estarei só.

Agradeço que me tenham confinado ao lar e a família, porque posso fazer de toda a Terra meu lar e minha família.

Estou feliz que me chamem de dona de casa, porque posso apoderar-me da minha.

Estou feliz de não ser competitiva, porque então serei solidária.

Estou feliz de ser o repouso do guerreiro, porque posso cortar-lhe o cabelo enquanto dorme.

Estou feliz de ter sido excluída do campo de batalha, porque a morte não me é indiferente.

Estou feliz de ter sido excluída do poder porque longe do poder me distancio da ambição e da cobiça.

Estou feliz que me tenham excluído da arte e da ciência, porque as posso inventar de novo.

Com tanta fortaleza acumulada, com tantas habilidades e destrezas aprendidas, mulher, se tentar conseguirá o mundo do avesso.

(Texto de autoria desconhecida. Supõe-se ser de uma sindicalista da Guatemala)


Colaboração na tradução: Lula Ramires

8 de março – Dia Internacional da Mulher - 2007
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